terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Demônios Putrefatos


O peregrino segue sempre avante, para cima, pela trilha entre os cadáveres. Demônios putrefatos, cujo chorume explode das veias. Não há sangue . Os demônios são feitos de lixo. O peregrino já não aguenta dar mais um passo. Tenta arrancar forças, respira fundo. Mas, como respirar com esse fedor de podridão no ar?

-- Ei!

Ele olha ao redor, tentando achar vida, naquele deserto infernal, enquanto arranca as botas de solas gastas, e enfia mais uma página de jornal dentro, com as ultimas notícias do Apocalipse.

-- Ei!

-- Quem chama?

-- Aqui! Do teu lado!

O peregrino se vira para a direita e se depara com os restos de um demônio gordo, de cuja barrigona, irrompem enormes vermes, como macabra macarronada. O demônio usa uma fralda geriátrica. E de seu queixo saem muitos pêlos que se movem. Não! São apenas moscas que fazem seu nauseabundo ninho no cavanhaque. O peregrino alisa a própria barba do queixo, e diria até que aquele demônio se parece com ele, mas o estado de decomposição é avançado. E só pelas forças dos abismos infernais, é que a criatura o enxerga com suas órbitas vazias.

-- Olá, doce peregrino!

--Que queres de mim, demônio?

--Não se estresse! Pegue a caixa de remédios que carrego na fralda!

-- Não preciso do remédio do inferno!

--Rá! Rá! Rá! São Rivotril que estais no alto da prateleira! Socorrei-me!! Rá! Rá! Rá!

Nesse momento, uma víbora negra irrompe da bocarra macabra. E olhos vermelhos o fitam.

-- O que pensa que encontrará lá em cima? Teu fim será igual a destes corpos! A alma não existe! Nada existe, alem dessa carne que o cerca! Vamos! Aproveite enquanto pode! Quer diversão?

De repente, uma linda mulher sai do meio dos cadáveres, oferecendo um sexo molhado e desejoso de procriação.

-- Ela está ovulando, peregrino! Como é que está escrito naquele livrinho, mesmo? Crescei e multiplicai-vos! Rá! Rá! Rá! Crie mais matéria, peregrino!

O peregrino ergue seu cajado e empala a criatura com aparência de mulher, que guincha terrivelmente, e de suas costelas saem tentáculos peludos, o que parecia ser uma mulher, é na verdade uma enorme e peçonhenta tarântula. Nosso herói, então, enterra o cajado mais profundamente, o que era um sexo feminino, vira uma bocarra gosmenta, cheia de presas mortais.

O peregrino se concentra, arrancando forças alem de sua compreensão, e, num vai e vem violento, parte a terrivel aranha no meio.

A víbora negra se diverte:

-- Oh! Que bruto! Acabaram de se conhecer!

-- Morra!

O cajado se levanta aos céus, e iluminado por um raio que clareia o cume sinistro da montanha feita de corpos, desce rapidamente, espatifando a cabeça da serpente. Os cadáveres começam a se dissolver, e numa carreira, o peregrino sobe a montanha escorregadia, a matéria putrida vem a seu encontro, como que querendo conscientemente, tragá-lo num redemoinho de suco gástrico.

Neste momento, fico na duvida. Penso que um anjo poderia salvá-lo no ultimo instante. Ou que, miraculosamente, o mar de chorume poderia abrir-se ao meio.

Mas, não. Decido que meu peregrino deve morrer. Pelo menos, para o mundo.

E assim sendo, sua fé o salva. Por ora, pois a caminhada ainda está muito longe de terminar.

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